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CAPÍTULO 24: O EMPREENDEDOR BUMERANGUE: TRABALHANDO PARA O EX.

  • Foto do escritor: Fernando Rogério Jardim
    Fernando Rogério Jardim
  • 18 de jan. de 2016
  • 5 min de leitura

Quando o cordão umbilical com seu ex-chefe vira um estilingue.


Olá, primatas depenados pelos atalhos da evolução! ¿Prontos para mais um capítulo? Então ouçam essa estória: José da Silva construiu uma brilhante & tranqüila carreira de sucesso no RH dum banco donal, de pròpriedade de brasileiros. Um belo dia, enquanto os pombos cagavam nos pedestres e a vida prèparava seus cadáveres, os donos desse banco resolveram vendê-lo para uma holding britânica que já controlava uma rede de bancos no Brasil. Ih! No processo de fusão das unidades, verificou-se que o cargo de diretor que José da Silva ocupava no RH há dez anos sobrepunha-se a outro cargo, já ocupado por um executivo da holding britânica. E as próprias funções do RH achavam-se ali em adiantado processo de terceirização. Hum... José da Silva parecia estar sobrando nesse baralho. Dito e feito: no final do ano, nosso pobre herói tomou um acrobático & pirotécnico pé-na-bunda, descobrindo as maravilhas do desemprego pela primeira & última vez. Desacorçoado, José da Silva juntou os cacos do seu ego em frangalhos, colou-os com sua experiência profissional, uniu tudo com a multa rescisória que recebeu do banco e fez aquilo que todo executivo demitido faz: abriu uma consultoria de treinamento em RH.

As coisas iam bem, apesar da falta que José da Silva sentia de ter um emprego garantido, com salário estável e condições constantes todo mês. Ele completava a renda da consultoria com palestras e pequenos serviços extralegais, que envolviam chineses, aduanas e cigarros. Abafa! Eis que, durante o coquetel duma palestra, José da Silva encontrou um ex-colega de banco, que ainda continuava trabalhando lá. Eles trocaram fofocas e cartões. Conversa vai / conversa vem, esse ex-colega narrou a José da Silva a dificuldade que o banco vinha enfrentando para contratar e manter talentos. Hum... Uma luzinha na cabeça de José da Silva piscou: oportunidade! oportunidade! oportunidade! Mas outro alarme também soou: ressentimento! ressentimento! ressentimento! E aqui eu encurto a estória: esse colega levou ao banco a notícia de que José da Silva — aquele! — trabalhava agora como consultor autônomo de RH, e poderia, com seu talento e experiência, resolver os problemas da companhia com contratações. Assim, José da Silva, o ex-diretor de RH do Banco dos Abutres & Pardais S/A, voltava a trabalhar — mas doravante como freelancer — para seus antigos nhonhôs. ¿Isso não é bárbaro? Isso chega a ser Conan, de tão bárbaro! No capítulo anterior, eu lhes falei sobre a alternativa de transformar seu hobby num negócio. Essa é uma das várias portas-de-entrada para os empreendedores e as microempresas. Disse-lhes ainda que essa medida inspira alguns cuidados, como o risco d'o empresário contaminar seu passatempo, seus momentos de relaxamento, com as aporrinhações administrativas e o compromisso dum expediente de quatorze a dezoito horas diárias. (Eu já lhes disse que os pequenos empresários trabalham mais que camelos, né?) Certamente, a possibilidade de unir o lucrativo ao agradável, os amigos aos sócios, o escritório à residência e o trabalho à diversão seduz muitas pessoas, colocando-as, entretanto, em rota de colisão com a disciplina que é necessária para se tocar uma firma em casa, sem que as questiúnculas emocionais (autossabotagem e pròcrastinação) atrapalhem os negócios e a convivência. Eu, pessoalmente, sinto uma baita inveja-branca de quem consegue trabalhar em casa. Quando converso com pessoas assim, sei que estou diante dum asceta, dum monge, dum indivíduo disciplinado que se mantém imperturbável diante das distrações. Isso não é para um bocó-de-mola como eu. Exemplo: enquanto escrevo este capítulo, o Neném (meu gato) tenta chamar minha atenção passeando felinamente sobre o teclado do meu notebook — com aquela carinha de gigolô que só ele faz. Bom... Além disso, transformar hobby em negócio exige que o empreendedor adquira hàbilidades administrativas que nada têm de divertidas ou relaxantes, lúdicas ou criativas. Por sua vez — e agora eu retorno ao ponto central do capítulo — abrir a própria empresa para prestar serviços ao antigo patrão tem também seus pontos positivos, negativos e cuidados. Cada vez mais, eu noto que esta tem sido uma alternativa comum para executivos experientes, amigos meus, que, após trilharem uma bela & longa carreira em grandes corporações, retornaram a elas como terceirizados, consultores, prestadores ou freelancers. Claro: e aqui vai um conselho gratuito aos jovens universitários da geração Y: saiam das suas empresas sem escândalo, deixando as portas abertas para um futuro retorno — por mais que seus ex-chefes tenham sido nhonhôs sádicos & cínicos; por mais que você tenha feito o trabalho de arrivistas escrotos; por mais que você queira vê-los morrendo de câncer no pênis!


Engula o recalque! Trabalhar para os ex-patrões exige, entes-de-mais-nada, muita flêuma, profissionalismo, confiança e crédito no mercado. Eu chamo esse cara de empreendedor-bumerangue: ele foi lançado e voltou à empresa que o demitiu, mas agora como autônomo alforriado. Eu comparo esse pequeno empresário ao jovem cavalão que saiu da casa dos pais, mas continua almoçando & jantando às custas da mamãe. Piadas à parte, há aspectos positivos, negativos e cuidados a serem tomados aqui. E você, jovenzinho & jovenzinha, não pense que esta é uma alternativa disponível sòmente para executivos experientes. No trabalho-de-campo que fiz para o doutorado, topei com duas empresas incubadas no CIETEC que tinham como principais clientes as ex-empresas em que um dos pròprietários trabalharam. Entendam: a primeira grande vantagem disso é contar, logo de cara, com um cliente graúdo e famoso, ao qual você poderá associar sua marca e nome. Ter como cliente um ex-nhonhô — alguém que conhece seu trabalho, que você também conhece e do qual você sabe o que esperar — poderá fàcilitar bastante processo de negòciação, reduzindo seus gastos com divulgação, advogados, auditores, etc.


Se as condições permitirem sua informalidade, seu contratador sairá ganhando, ao reduzir seus gastos com encargos trabalhistas; e você também ganhará, pois poderá negociar preços maiores. Trabalhar para seu ex-chefe agora, de igual para igual, poderá lhe franquear a rede de contatos dele, com toda uma série de novos clientes graúdos à disposição. Isso inclui a formação de parcerias com seus ex-coleguinhas que eventualmente ainda trabalhem naquela empresa e cujos talentos você poderá aproveitar. Ademais, quando se presta serviços para empresas que já conhecemos, suas demandas tendem a vir com um escopo já definido e especificações delimitadas — o que pode até tornar o serviço meio tèdioso, mas bastante econômico. Por fim, se nada der certo, restará sempre a esperança d'o escravo forro & fujão ser recontratado pelo patrãozinho. Daí surgem as questões: ¿você gostaria de se relacionar com sua ex-empresa? ¿Há aí mágoas que poderiam atrapalhar esse novo relacionamento? ¿A empresa costuma impor cláusulas de exclusividade, confidèncialidade e pròpriedade intelectual aos seus servidores? ¿Qual é o nível de controle e prestação-de-contas que seu antigo nhonhô terá sobre seu novo trabalho?


É que nem tudo são flores. Há difìculdades a se considerar quando se flerta com sua antiga senzala. Em primeiro lugar, deve-se avaliar que autonomia (ou falta dela) você terá para exercer suas novas funções. Empreendedorismo tem muito a-ver com autorrealização. Pergunte-se, portanto, o que você perderá unindo seu destino ao da sua ex-empresa. Aqueles serviços com escopo definido podem ser ótimos para reduzir custos, ¿mas eles pagarão o tédio que você sentirá cumprindo atividades limitadas e repetitivas? Em segundo lugar, faça as contas na ponta do lápis, para ver se sua pequena empresa não está assumindo os encargos tributários do seu nhonhô safadão. Em terceiro lugar, há o risco de você se sentir num eterno dia da marmota, vivendo um remake dos piores filmes de pastelão corporativo. ¿Que lembranças você guarda dessa empresa contratante? Por fim, estruturar seu negócio em total dependência dum único & grande cliente que, além disso, foi seu ex-emprego, poderá mal-acostumá-lo perigosamente, impermeabilizando-o para novos contatos e clientes. Noutras palavras, é bom saber que a casa da mamãe está aberta para o retorno, ¿mas quando é que o bebê vai crescer?


Até-mais-ver!


¿QUEM É JOHN GALT?

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© 2016 por Fernando Rogério Jardim © Wix

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