DICA DE (NÃO-)LEITURA 15
- Fernando Rogério Jardim
- 27 de jan. de 2016
- 3 min de leitura

Nem vêm! Vocês são testemunhas de que eu já elogiei efusivamente o Michael Gerber aqui (clique e veja). Basta reler a segunda dica de leitura, onde eu resenho e comento as descobertas que ele fez em seu best-seller, "O mito do empreendedor". Nesse livro, Gerber matou a charada do porquê tantas empresas pequenas fracassam. Seus criadores não conseguem fazer o indispensável: padronizar as atividades operacionais do negócio, criando rotinas simplificadas e replicáveis que poderiam ser delegadas a terceiros. Sem isso, empreendedores sobrecarregados acabam acumulando o trabalho de concepção (o estratégico, do futuro) e o trabalho de execução (o operacional, do presente). Sendo profissionais competentes neste último quesito, suas empresas acabam crescendo. Sim. Mas ao crescerem, elas se tornam mais complexas e difíceis de serem geridas. A sobrecarga de atividades operacionais e estratégicas, a falta de padrões e rotinas, a dificuldade de delegar atividades — tudo isso junto — leva, ou ao colapso da empresa, ou à loucura do empresário, ou a um processo de autossabotagem por meio do qual o empreendedor evita que seu negócio cresça. "O mito do empreendedor", enfim, é o livro de gênio, sem tirar nem pôr.
Pois muito que ótimo! Então, ¿o que Michael Gerber teria para nos oferecer de novidade nesse outro livro: "Desperte o empreendedor que existe em você?" Bem... deixem-me pensar. 1) Uma longa e piegas lenga-lenga sobre sua própria história de sucesso, repleta de autopiedade e autoelogios, os quais o autor teve a bondade de colocar na boca de ninguém-menos que sua mãe nonagenária e certamente gagá (pág. 23-26). 2) Uma porção tamanho-família de baboseiras de autoajuda do pior jaez, a qual oscila entre a histeria evangélica, a retórica de líder-de-seita e a megalomania de napoleão-de-manicômio. (Parece que Gerber tornou-se discípulo ou admirador de Gurdjieff e outros picaretas orientais (pág. 31 e 41), o que explica muita coisa). 3) Uma longa, chata e egótica história de como ele fundou uma entidade chamada ¿Quem é Manny Espinosa? -- uma espécie de Febem tecnológica ou Senai carcerário, voltado a capacitar jovens latinos coitadinhos & vulneráveis (pág. 169-173). 4) Outra história igualmente entèdiante e egocêntrica de como ele criou outra coisa chamada Sala dos Sonhos — que ele nunca explica bem o que é (o que nos faz imaginar as piores hipóteses) (pág. 69-72). ¿Vocês estão notando meu sarcasmo e decepção?
Depois dum livro de gênio, Michael Gerber nos apresenta uma baboseira de autoajuda digna dos livrinhos para colorir. Duas expressões amèricanas resumem bem esse livro: pensamento desejoso (wishful thinking) e contação-de-histórias (storyelling). Todo o livro é cheio disso. Pois agora você, leitor, deve estar perguntando maldosamente: "Ah, o Fernando é amargo como a Dolly Cytrus! Não é possível que esse livro não tenha nada de que se aproveite." Tem sim. Eu destacaria duas passagens do livro que me parecem proveitosas. Em primeiro lugar, a classificação que o autor faz das quatro dimensões do empreendedor: o sonhador, o pensador, o contador-de-histórias e o líder (pág. 31-34). Em segundo lugar, seu lúcido passo-a-passo para a construção duma empresa de sucesso, com dezesseis conselhos importantes (pág. 221-229). Todo o resto do livro poderá ser solenemente e completamente ignorado, sem qualquer prejuízo para a sua saúde mental. Com isso, Michael Gerbem passa a integrar o hall da má-fama bibliográfica, encabeçado por Justin Herald e sua psicologia do vamos-que-vamos. Fica então a lição: depois de escrever um best-seller, não estrague tudo tentando escrever outro. Ah! E antes que eu me esqueça: "amargo" é o útero que o pariu!
GERBER, Michael. "Desperte o empreendedor que há em você". São Paulo: M. Books, 2010. 237páginas. R$ 89,00.
DEPOIMENTOS:
"¿Sabe quando um diretor faz aquele filme inesquecível; daí ele resolve filmar sua continuação e sai aquela porcaria vergonhosa? Então... Isso também acontece com livros."
Doutor Redondo Quadros, palestrate, coveiro e agitador cultural.
"O livro se chama "Desperte o empreendedor que existe em você". Olha... já vai ser um grande desafio manter-se acordado lendo esse livro. Despertar mesmo, eu já não garanto."
Professora Marcelina Escorreita, ufóloga, homeopata e sociopata.
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