CAPÍTULO 21: ENCERRANDO A FATURA: TRÊS EXEMPLOS ENXUTOS & VIÁVEIS
- Fernando Rogério Jardim
- 28 de dez. de 2015
- 5 min de leitura
¿O que uma sorveteria, um aplicativo e um petshop têm em comum?

Oi, gente júnior do ano velho! Este é o terceiro ou quatro — talvez o último — capítulo duma série sobre o método da startup enxuta. Reparem que estes capítulos seqüenciais pretendem acompanhar o passo-a-passo de lançamento dum pequeno negócio escalável e lucrativo (ao menos, viável). Eu me detive neste tema por considerá-lo, até o hoje, a melhor estratégia de mìnimização de custos & riscos para se empreender saudàvelmente. Créditos sejam dados ao Eric Ries. As alternativas, vocês já sabem, são 1) elaborar um extenso plano-de-negócio com setenta páginas, que jamais será lido ou aplicado e ficará obsoleto assim que você puser nele o ponto-final; e 2) ter uma idéia de jegue e, num surto de insanidade e saracoteio, lançá-la no mercado para ver o que acontece. (E você realmente verá o que acontece).
Creio ter sido didático o-bastante nas últimas postagens, explicando os conceitos principais. Neste capítulo, pretendo dar exemplos de como funcionaria a estratégia da startup enxuta para três negócios hipotéticos. Então, vamos ao primeiro. Você e seus amigos do curso de gastronomia reuniram-se para criar a Sorvetes Abominável Homem, voltada para um público seleto & elitista, dedicada a sabores gourmet. Com pouco capital, vocês criaram uma página da sorveteria nas redes sociais e fizeram uma pesquisa simples (netnografia) sobre os sabores exóticos & entojados que o público da classe A mais curtiria. Usando a própria cozinha dos sócios, sua equipe fabricou as primeiras unidades e as distribuiu entre os amigos da balada. Salvo algumas críticas sobre a embalagem e a apresentação, parece que o negócio ia decolar.
Vocês corrigiram alguns problemas de execução dos sorvetes e, produzindo ainda tudo artesanalmente, selecionaram três sabores exóticos que tiveram o melhor retorno do público, oferecendo-os em promoção ao pessoal da faculdade. Vocês também os deram a um chefe-de-cozinha irritadiço e sincericida com o qual travaram contato. As pessoas até gostaram, mas não estavam dispostas a pagar o preço sugerido. Talvez o conceito gourmet precisasse ser abandonado, pois não permitia atingir um público amplo e produzir sorvetes em grande escala. Vocês então arriscaram fazer uma pivòtagem: mantiveram a idéia dos sabores exóticos, mas orientaram-se para atingir o público universitário — menos exigente e mais afim com a proposta da empresa, o perfil da marca e dos donos. Parece que agora vai!
Segue então o segundo exemplo. Você é um nerd patético, tímido, gordo e virgem que mora com os pais e criou, entre uma e outra visita a sites pornôs, um aplicativo para contagem de calorias, o Byte Calo. O conceito é simples, são pouquíssimas linhas de programação, e o aplicativo mostrou-se compatível com os principais sistemas para telefones cèlulares. Mas a interface do aplicativo é esquisita, nada-nada intuitiva e tão tosca quando seu inventor. Neste momento, sòzinho no quarto, você olha para seu imenso poster de Guerra-nas-Estrelas e se pergunta: ¿minhas prèmissas estão corretas? ¿esse negócio vai dar dinheiro? A saída é oferecer esse aplicativo àquele seu primo saradão e ratazana-de-academia que você inveja e/ou deseja em segredo. (Crianças, eu confesso que me divirto escrevendo essas besteiras!)
Seu primo adorou a idéia. Mas, assim como você suspeitava desde o princípio, ele propôs algumas alterações de interface e sugeriu que o aplicativo incorporasse outras funcionalidades, como contagem de batimentos, temperatura, calorias gastas, quilômetros percorridos, anabolizantes injetados, etc. Hum... uma dúvida o assalta como um petista! Agora você não sabe se reúne todas essas funções num único aplicativo e abre-mão da simplicidade, ou se cria um aplicativo para cada funcionalidade independente, aumentando as vàriáveis com as quais terá de lidar. Você precisa dum retorno... e de mais dados! Você então cria um site e disponibiliza esses aplicativos em separado para download, em versão shareware. Dois deles se destacam como os mais baixados: o de contagem de calorias e o de quilômetros percorridos.
Você então cria uma versão beta desse aplicativo, integrando aquelas duas funções mais curtidas pelos usuários iniciais. Claro: as outras funções você esconderá na manga como um bônus do aplicativo. Sua hipótese de valor foi plenamente confirmada: as pessoas querem mesmo consumir seu produto. Depois de protegê-lo por copyright, resta-lhe agora testar sua hipótese de escala, quer dizer, você precisa descobrir como fazer para ganhar dinheiro com esse troço — se por contribuições espontâneas ou patrocínio, se por cobrança única pelo download, se por cobrança periódica mensal ou por acesso, se por cessão de direitos para alguma academia ou plataforma, etc. Seu desafio agora é erigir uma empresa viável ao redor dessa inovação bem-sucedida, criando outras linhas de produtos. Então, você dá início a mais um ciclo.
Vamos agora para o último exemplo. Você, assim como eu, adora bichos. (Este que vos fala tem um gato chamado Neném e um cachorro chamado Rafael). Com base nas próprias dificuldades de transportar seus bichinhos para veterinários, em viagens e passeios, você criou o Cãominhão: um serviço de transporte de animais de estimação. Só! Você começou fazendo isso de maneira informal, quase que como um favor para seus amigos & vizinhos. Quando sua sogra petista precisou ir ao veterinário tomar vacina antirrábica, porque rosnava demais, foi você quem a levou em segurança na gaiolinha. Com o tempo, porém, você notou um padrão curioso no feedback dos clientes. Vendo seu desvelo & carinho com os animais, eles sempre vinham com as mesmas perguntas: ¿você também tosa? ¿você dá banho? ¿você também castra?
Você não é bobo e percebeu que havia ali uma demanda represada, gritando para ser atendida. Daí veio o estalo: seu negócio de transporte animal pròsperara justamente porque não havia petshops num raio de cinco quilômetros ao redor do seu bairro. Daí a necessidade d' os clientes levarem seus bichinhos para o distrito vizinho. Então, diabo, ¿por que não oferecer você-mesmo todo esse serviço de banho-tosa-vacina, barba-cabelo-bigode? Você entendeu o feedback da clientela e percebeu, pelo aumento do zoom, que seu serviço de transporte de animais poderia ser parte dum negócio muito maior. E isso, meu filho, é um pivô! Em sòciedade com um amigo seu veterinário, você resolveu criar o próprio petshop — que leva e traz os bichos às casas dos seus donos. Taí seu diferencial, taí seu benchmarking! Produza-teste-aprenda!
¿Gostaram dos exemplos? ¿Não? Então vão beijar a bunda do capeta! Eu poderia ter dado mais exemplos, mas acho que posso encerrar a fatura por aqui. O que todos esses negócios têm em comum é que eles começaram pequenos e cautelosos, lançaram mínimos produtos ou serviços viáveis, sem muito tererê, apròximaram-se do nicho-alvo devagarinho, testando suas hipóteses de valor e de escala conforme cresciam, bolando e lançando versões alfa, beta & gama de protótipos inacabados à medida em que aprendiam mais e mais com os feedbacks da clientela, os erros e os acertos, completando ciclos curtos e acelerados de produção-aplicação-aprendizado. Esta é a essência da estratégia da startup enxuta. Comece simples, inclua o cliente desde cedo, vá testando hipóteses e dê guinadas quando necessário. ¿Entendido?
Até-mais-ver!
¿QUEM É JOHN GALT?
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