CAIXINHA DE FERRAMENTAS 8
- Fernando Rogério Jardim
- 23 de dez. de 2015
- 4 min de leitura
Olá, rebanho enredado em meu cercadinho internético! Retornei aos braços do povo com mais uma ferramenta estratégica do peru. Antes-de-mais-nada, escrevendo sobre essa ferramenta, confesso que vários filmes passaram pela minha cabeça. Não me refiro aos filmes que nós pagamos para assistir, mas aos filmes que os outros nos pagam para interpretar diàriamente. Falo do nosso bom & velho ambiente corporativo. A ferramenta em questão — chamada de modelo de Greiner — traça as seis fases e as seis crises pelas quais uma empresa atravessa em seu ciclo-de-vida. Aposto que vocês perceberão semelhanças com as empresas em que trabalham ou já trabalharam. O modelo de Greiner ajuda-nos a refletir sobre a dinâmica de crescimento das òrganizações e, com isto, a prèver suas fases e crises, antecipando-nos às transições necessárias de maneira planejada.
Faço, porém, um pequeno acréscimo ao modelo de Greiner, colocando uma primeira crise logo de-cara: uma crise de criatividade. Estudando o universo das startups e vivendo-o por experiência própria, posso dizer que os primeiros meses duma empresa iniciante são gastos com brainstorms intermináveis, reuniões longas e sem destino definido, falta de foco, difìculdade de definição do nicho e do escopo, megalomania estratégica e tiro para todos os lados, seguida duma estúpida & suicida obrigação (autoimposta) de abraçar o universo. Essa crise de criatividade, ao contrário do que imaginam, não é causada por falta de idéias, mas por falta de foco nas idéias... e por excesso de idéias! Tudo parece aos sócios criativo & lucrativo. Uma vàriedade insana de produtos e serviços são criados em segundos, para sumirem nos segundos seguintes. Uma insanidade!
Superada essa crise, definido o escopo do negócio e o segmento de mercado, o nicho e o cliente, o produto ou o serviço, a empresa começa sua fase 1: crescimento por meio da criatividade. Esta é a realidade da maioria das startups que visitei durante o doutorado: impera ali a informalidade na comunicação e nos procedimentos, a desòrganização e a improvisação: muito trabalho e pouco dinheiro. A atmosfera de criatividade é algo que se capta no ar. As idéias gèniais faíscam e a pequena empresa começa a decolar. Mas conforme o dinheiro e os parceiros vão entrando, todos sentem a pressão e a necessidade de profissionalizar a gestão da firma — sobretudo as partes jurídica e contábil. Essa fase termina, portanto, com uma crise de liderança, na qual os fundadores precisam virar gente-grande ou contratar administradores profissionais para ajudá-los.
A empresa entra então na fase 2: crescimento por meio da direção. Ela sofre um choque-de-gestão: departamentos são compartimentados, setores são divididos, os procedimentos ganham registros e controles, etc. Um bando de gente nova — carrancuda & apressada — invade a startup, trazendo mais lucros e menos risos. A empresa cresce por conta dos ganhos-de-eficiência auferidos pela melhor direção das tarefas. Porém, chega-se a um ponto em que o detalhamento e a administração dos inúmeros processos envolvidos tornam-se impossíveis para os poucos gerentes centrais: é preciso delegar tarefas para as pessoas do chão-de-fábrica! (Isto é descrito com riqueza de detalhes por Michael Gerber, no clássico "O mito do empreendedor"). Esta fase, portanto, termina com uma crise de autonomia, onde novas estruturas baseadas em delegação são criadas.
Na fase 3 — crescimento por meio da delegação de tarefas — as atividades operacionais (o chão-de-fábrica) finalmente se separam das funções táticas (administração, coordenação) e das atividades estratégicas (análise de mercado, visão de futuro, prospecção de tecnologias e concorrentes, etc.). Com gerentes de nível médio ocupando a gestão do dia-a-dia, a cúpula da empresa passa ter tempo de-sobra para monitorar a empresa como um todo e tratar de assuntos mais holísticos e importantes (estratégicos). O negócio flui; a empresa vai. Mas com o passar do tempo, percebe-se que os departamentos que foram segmentados na fase anterior precisam duma coordenação central mais sofisticada; precisam trabalhar em sintonia, pois sua separação começou a criar ruídos e surdos, produzindo ineficiência por má-comunicação. Surge daí uma crise de controle. São as dores da vida adulta.
A empresa entra então na fase 4: crescimento por meio da coordenação & monitoramento. Algumas mudanças são feitas. Os negócios prèviamente segmentados em departamentos são reòrganizados e reunidos ao redor de linhas de produtos ou serviços. Reforça-se o alinhamento dos funcionários aos objetivos da empresa por meio de planos-de-cargos, incentivos financeiros e comunicação. Contudo, pouco-a-pouco, as atividades de coordenação vão afogando a empresa sob uma quantidade crescente de papelório e burocracia — o que termina por sabotar sua expansão posterior. Decisões urgentes e que poderiam ser delegadas para as periferias da cadeia-de-comando precisam agora subir uma torre-de-Babel hierárquica até pousar no trono de Deus — ou cair no colo do capeta. Essa fase termina, portanto, com uma crise de burocracia. (¿Quem nunca?)
Na fase 5 — crescimento por meio da colaboração — uma nova estrutura sòcietária e um novo òrganograma são introduzidos. Os controles formais e austeros, criados nas fases anteriores, são substituídos pelo compromisso, pela autonomia e pelo bom-senso profissional. O grupo gestor se reagrupa e se flexibiliza em termos duma nova estrutura, apoiada em sistemas sofisticados de informação e recompensas. A òrganização deslancha novamente. Mas essa fase encontra seus próprios limites nas fronteiras de crescimento da òrganização. Noutras palavras, a empresa enfrenta uma crise de crescimento, porque não tem mais para onde crescer; e só continuará crescendo se entabular parcerias com outras firmas em áreas complementares. É aqui que entra a inteligência estratégica, para encontrar os melhores parceiros e os melhores arranjos de parceria.
Na fase 6 — crescimento através de parcerias — a empresa começa a se movimentar rumo à criação de redes, à internacionalização, terceirização, aquisições de companhias, fusões e criação joint-ventures. Embora esquemático e estereòtipado, o modelo de Greiner esclarece muitas das coisas que nós — seja como funcionários, seja como empresários — observamos ou sofremos no dia-a-dia das empresas. Para o autor, a taxa de crescimento das òrganizações varia de fase para fase. A duração dessas fases depende da taxa de crescimento do mercado onde a empresa está inserida. E o principal: quanto mais tempo durar uma fase, mais difícil será sua transição para a próxima e mais dramática será a crise. A gente sabe disso: as civilizações enfrentam crises; as òrganizações enfrentam crises; os casamentos vivem em crises. A experiência é universal. Só muda a escala.
Até-mais-ver!
Modelo das seis fases e seis crises de Larry Greiner.
Comments