CAPÍTULO 27: ADVOCACIA EMPREENDEDORA: DEPOIS DO CANUDO E ANTES DA VARA
- Fernando Rogério Jardim
- 8 de fev. de 2016
- 4 min de leitura
Há uma vida pós-diploma; e ela não precisa ser um inferno.

Olá, futuros-do-pretérito! ¿Como têm passado sem presente? Eu, mal! Vocês se lembram que, no capítulo anterior, eu tratei brevemente dalgumas profissões que costumam ser hostis ao comportamento empreendedor, tratando-o como uma bactéria que debilita a cultura ou o caráter do hòspedeiro, causando-lhe convulsões de entusiasmo, inconformismo e criatividade. Um horror! Um horror! Os motivos para essa hostilidade são vários e costumam incluir desde pruridos de natureza ético-moral (geralmente justificados) até interdições corporativas, controles e punições simbólicas por parte dos pares, distinções hieráticas, etc. Eu incluí a medicina, a advocacia, a docência e as atividades artísticas nesse rol da infâmia.
Claro: aquilo que uns vêem como terreno infértil e empreitada irresponsável, outros vêem como uma oportunidade de apostarem suas fichas justamente aí nesses nichos áridos, tornando-se os primeiros entrantes dum novo universo: os pioneiros que explorarão sòzinhos um veio de riquezas & desafios, enquanto a concorrência come poeira ou ànseia pelo colinho do Estado-Babá, escondida debaixo das cobertas em posição fetal. Portanto, são justamente essas áreas hostis que merecem uma atenção cuidadosa dos universitários que prètendem empreender na vidas pós-diploma. Sim, porque existe uma vida após o diploma, ¿sabiam? — e ela não se parece nada com aquilo que vocês, trêmulos, ouviram dos seus mestres-escolas.
Como já sabem, eu ainda estou professor de disciplinas de Direito; e como um alienígena incômodo nesse campo (minha formação é de sociólogo, o que não melhora muito a minha reputação), acho que tenho algo a dizer sobre as oportunidades inexploradas do empreendedorismo no mundo jurídico. Antes-de-mais-nada, uma pergunta que os professores universitários evitam se fazer (porque a resposta costuma provocar depressão) é ¿para que, afinal, eu estou formando essa molecada? Digo que esta pergunta é meio depressiva porque sua resposta não se encontra na faculdade; encontra-se antes no mercado-de-trabalho. Porém, como eu disse acima, a docência é uma das carreiras hostis ao "capitalismo malvadão".
Portanto, estudantes e professores encontram-se num abraço de afogados: os primeiros não sabem o que estão fazendo ali; e os segundos, além de não buscarem a resposta para isso, não admitem se embrenhar onde poderiam encontrá-la: o maldito mercado! A coisa ainda se complica nos cursos de Direito, onde toda essa chanchada tràgicômica ganha uma camada espessa de mofo & bolor. Enquanto alunos decoram brocados no Latim de Cícero & Políbio, no mundo externo, contratos de aquisição de companhias bilionárias são redigidos no nada épico Inglês de Gates & Jobs. Enquanto necrotérios acadêmicos ministram disciplinas tão prafrentex como Direito Romano, o mundo lá fora é totalmente digitalizado, virtualizado, revolucionado.
Às vezes, eu tenho a impressão (a jato-de-tinta) que meus alunos cursam Direito apenas para se vestirem como paquitos (durante a graduação) ou se tornarem imitadores deprimentes dos seus próprios mestres (depois de formados). Os melhores ali têm como máxima ambição na carreira parasitar nossos intestinos ou beber nosso sangue como lacaios do Estado-Leviatã. Ninguém ali percebe que advogados também são profissionais liberais; que um escritório de advocacia não passa duma startup com carpete; que um cliente é, afinal, um cliente; que toda causa é um projeto que precisa ser gerido; e que um processo judicial é um fluxo de recursos & produtos cujas semelhanças com uma linha-de-montagem são escàndalosas. E tem mais:
1) O fluxo-de-caixa dum escritório de advocacia costuma ser irregular. Na melhor das hipóteses, é sazonal. Portanto, ferramentas de estatística e gestão de finanças não lhe fariam nenhum mal. 2) Processos são projetos com fluxos, prazos e tarefas definidas, que poderiam ter sua conclusão acelerada e fàcilitada com algumas ferramentas toyotistas, como o scrum e o kanban — que ensinarei aqui futuramente. 3) Um dos pontos frágeis dos escritórios de advocacia são a prestação-de-contas e a transparência no andamento dos processos. Clientes precisam de feedback. Afinal, é a vida, o bolso ou o rabo deles que está em jogo. A Internet já oferece uma infinidade de aplicativos grátis que poderiam automatizar essa comunicação.
4) As regras idiotas da OAB proíbem a captação de clientes pelos advogados. Porém, algumas técnicas de marketing (personal branding, benchmarking, patrocínio e apoio a eventos, diferenciação no atendimento, pacotes de serviços, etc.) poderiam substituir com vantagem as práticas mais agressivas ou tradicionais de propaganda. 5) Geralmente, advogados não prospectam oportunidades e muito-menos ameaças. Simplesmente especializam-se numa área e vão aceitando as encrencas que aparecem. Estratégia, para eles, refere-se apenas à linha que adotarão no processo. Poucos lêem coisas de outras áreas ou saem do escritório para verem o que está rolando no mundo sublunar das pessoas comuns. É uma pena!
6) A contratação de estàgiários e funcionários é desleixada ou distànciada da realidade. O treinamento é inexistente. A liderança dos sócios ou chefes oscila entre a tirania benevolente, o dèspotismo esclarecido e o papai-sabe-tudo. 7) Muitos escritórios de advocacia abrem (e por isso, acabam fechando) sem ter um modelo-de-negócios esboçado, sem conhecer sua clientela, sem se posicionar frente à concorrência. Enfim: morrem virgens de gestão! Nunca viram um canvas pela frente, nem uma análise SWOT, nem um ciclo PDCA, nem um quadro de scrum, nem um diagrama de Ishikawa... Nada! E o pior de tudo é que ninguém sente falta do que não conhece. Isso constitui a essência da ignorância; e esse é um problema de formação.
O principal problema da formação jurídica é que ela não tem foco; é ideológica (leia-se: marxista) e generalista (leia-se: superficial e pernóstica). Enfatiza-se de maneira exagerada o contencioso, negligènciando-se a àrbitragem, o consultivo e o sòcietário. O Brasil é o país da retórica e da oratória, do demagogo palavroso e da autoridade eloqüente. Porém, poucos cursos de Direito no país oferecem disciplinas de oratória & retórica. Disso decorre que nossos alunos saem sem falar direito (no duplo sentido da palavra), sem "presença-de-comando", sem postura ou gestual, sem fluxo verbal; eles gaguejam, falam dilmês, titubeiam; parecem estar mentindo para os juízes. Assistir a sustentações orais é, por isso, um espetáculo deprimente.
O Inglês Jurídico é desconhecido pelos índios dessa tribo. Empreender é considerado um palavrão da mesma gravidade que mèritocracia. Resumindo: os cursos de Direito no Brasil são fábricas de Viscondes de Sabugosa. Com sorte, saem dali alguns Odoricos Paraguaçus. Claro: quem fala isto é um ornitorrinco profissional: um sociólogo com viés corporativo que dá aulas para o Direito. Sinto-me, portanto, pregando no deserto quando falo dos ganhos que os advogados poderiam obter com os métodos & técnicas da administração; e das vantagens que os gestores poderiam conseguir, por sua vez, com uma abordagem sociológica. Essas áreas precisam dum diálogo de fronteira. Aliás, precisam mesmo é derrubar suas fronteiras!
Até-mais-ver!
¿QUEM É JOHN GALT?
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