DICA DE LEITURA 22
- Fernando Rogério Jardim
- 16 de mar. de 2016
- 3 min de leitura

Olá, fugitivos das próprias escolhas! Que tal essa crise linda de meu-deus, hein! Agüenta aí, porque isso ainda vai piorar muito! Bom... mudando de assunto e mantendo a tragédia, o livro que vou lhes indicar nesta semana têm a-ver com uma coisa que vocês estão perigando enfrentar muito-em-breve: o desemprego qualificado — que é um dos efeitos direitos de se "lacrar treze". Mas vocês, leitores, devem estar se perguntando petistamente: ¿o que isso tem a-ver com o empreendedorismo e as microempresas? Bom: tudo, se você considerar a possìbilidade d' os desempregados qualificados empreenderem como alternativa à perda do salário seguro.
E aqui há um fenômeno interessante. Enquanto que o desemprego dos trabalhadores desqualificados desperta maior compaixão (por causa da condição coitadinha dos envolvidos) e menor curiosidade (por serem óbvias suas causas), com o desemprego de colarinho-branco dá-se exatamente o contrário: a curiosidade é tanto maior e a sòlidariedade é tanto menor quanto mais elevada for a queda da vítima. Há um sentimento difuso de bem-feito! nisto, pois aquele cujo trabalho é contratar & demitir também pode ser demitido. E isso se mistura também com um medo retroativo do tipo se aconteceu com ele, imagina o que poderá acontecer comigo!
Eis a curiosidade que nos é plenamente satisfeita pelo excelente livro "Desemprego de colarinho-branco: a inútil busca pelo sucesso profissional", resultado da pesquisa porra-louca da jornalista Barbara Ehrenreich. A autora é uma esquerdista amèricana típica — daquelas que têm sonhos eróticos com o Obama e acha Guantánamo uma aberração. A diferença é que, ao contrário da esquerda brasileira, Barbara Ehrenreich é alfabetizada, intelectualmente honesta e procura conhecer a realidade antes de querer "mudá-la para melhor." Seu livro, salvo problemas pontuais, é um espetáculo etnográfico, um show de escrita, de humor e de crítica ácida.
Antes-de-mais-nada, o livro é uma delícia de ler. É sarcástico, é engraçado, é iconoclasta. Usando uma idèntidade disfarçada (inclusive mudando legalmente seu sobrenome), Barbara Ehrenreich (Alexander) finge ser uma executiva de relações-públicas à procura de emprego e, para conseguir uma colocação, submete-se a todos os auxílios & métodos, conselhos & desaforos para conseguir um emprego. E ao fazê-lo, a autora faz um mergulho de-cabeça no lado sórdido, na lama sinistra do universo corporativo — a faceta que os livros de motivação & liderança (aqueles ao gosto de Justin Herald) preferem não mostrar. O livro é a narrativa do calvário da autora.
Como esquerdista & militante, Barbara Ehrenreich não deixa de carregar-nas-tinturas, enfatizar exageros e poluir suas conclusões de pesquisa com alguma retórica obamista. Mas isso não invalida seu trabalho. Seu maior viés não é de ideologia, mas sim de amostragem. Por vir do meio acadêmico e jornalístico, por ter desfilado com currículo falseado (¿ela realmente achou que ninguém foi verificar suas informações?), por ser uma forasteira no ambiente corporativo, por não ter contatos e ìndicações, por ser quase idosa e por não conhecer informática, sua procura por emprego só podia mesmo ser — como diz o título — uma busca inútil pelo sucesso.
Barbara Ehrenreich, porém, interpretou seu fracasso pessoal como a prova cabal dum sistema malvadão — claro! — que tritura almas & corpos, transformando-os em zumbis mais-ou-menos dóceis ou cínicos. (Desde a década de cinqüenta, a esquerda dos EUA bate nessa mesma tecla: o sonho amèricano é um anticlímax — um belo mote para que ela expresse seus sentimentos antinacionais). E ao encontrar pelo caminho da derrocada profissional pessoas na mesma condição miserável que ela (algumas, aliás, parecem ter sucumbido a transtornos psíquicos), a autora acabou confirmando (para si-mesma) sua visão paranóica sobre o capitalismo. Bingo!
A análise que a autora faz dos gurus de motivação é devastadora, é insuperável. Sua prosa oscila entre o trágico e o cômico, mas é sempre uma maravilha. Seus métodos de pesquisa, embora esbarrem em evidentes ruídos éticos (admitidos pela própria autora no final do livro), são duma coragem e audácia que sumiram há muito tempo do jornalismo brasileiro. O desemprego de colarinho-branco, embora seja mesmo a bacia-das-almas dos executivos em derrocada (e este é o lado pela autora), é também o berçário dos futuros empreendedores — e daí o proveito desta leitura... que ao menos poderá iluminar nosso destino próximo sob a gangue petista.
EHRENREICH, Barbara. "Desemprego de colarinho-branco: a inútil busca do sucesso profissional." Rio de Janeiro: Record, 2006. 250 páginas. R$ 40,50.
DEPOIMENTOS:
"No Brasil, o sucesso profissional é uma temeridade quando procurado, tornando-se depois um motivo de escárnio para o seu portador tão-logo é conquistado honestamente."
Professor Felizardo Oneroso, cidadão provisório e refùgiado ético-moral.
"Há buscas inúteis mas honrosas, assim como há decisões difíceis mas corretas. O contrário também funciona. Aí entramos na ceara do funcionalismo público."
Professor Estipêndio Cadelinha, estrategista e semeador de tempestades.
Comments