CARTAS PARA JOVENS EMPREENDEDORES 13
- Fernando Rogério Jardim
- 26 de mar. de 2016
- 2 min de leitura
São Bernardo do Campo, 26 de março de 2016.
Olá, Sandro!
¿Como vão as coisas? Antes-de-mais-nada, faça-me um favor: mande seu irmão à merda. Toda semana, ele enche a minha caixa de e-mails com editais de abertura de concursos públicos, como se eu estivesse procurando uma boquinha num valhacouto. Eu recebo isso como uma ofensa pessoal, meu caro. Se eu tivesse vocação para a prèvaricação e a vagabundagem, já teria eu-mesmo conseguido uma sinecura nalguma autarquia municipal aparelhada por esquertdistas delinqüentes. Por isso, mande-o à merda por mim.
Mas quando à sua pergunta, cara, esta é uma tremenda pergunta. Supondo que eu trabalhasse num RH e estivesse selecionando empreendedores... hum... ¿que qualificações eu procuraria? Bom... Certamente não seriam as mesmas características que eu procuraria num funcionário tradicional. Ao contratar um peão qualquer, quero ver nele um vencedor nato; e certamente o avaliarei conforme o número de vitórias passadas. Porém, no empreendedor, as vitórias e as derrotas — atenção! — têm o mesmo peso.
¿Já se levantou da cadeira, Sandro? Pois eu vou repetir, para que você caia de-novo: como uma startup está muito mais exposta a riscos do que uma empresa madura, eu quero ter perto de mim -- como sócio ou como peão — alguém que já faliu de maneira acrobática & trapezística; alguém cujo catálogo de fracassos sirva de farol, brilhando na escuridão, na frente na minha fuça, alertando-me para não repetir os mesmos erros. Noutras palavras, eu não quero um vencedor virgem; eu quero um fracassado intrépido.

E tem mais. Enquanto que o funcionário tradicional eu avaliaria com base na sua adequação à vaga, no empreendedor, eu certamente procuraria características que o prèdispusessem a ser uma bomba-relógio, apta a avacalhar de-pròpósito as regrinhas imbecis que eu eventualmente criasse na empresa. Eu procuraria um baderneiro, um criador-de-casos, um iconoclasta, um violador dos bons costumes corporativos. Enfim: um bobo-da-corte com carta-branca para me dizer aquilo que eu preciso ouvir.
Num funcionário, num subordinado, a estrita observância à burocracia é fundamental, pois a burocracia gera padrões, rotinas e controles cuja meta é a redução dos riscos. Pois bem. Numa startup, contudo, eu ainda não tenho claros quais são os riscos que deverei eliminar; e quais são os riscos intrínsecos à empreitada. Além-do-mais, nessa fase inicial de testes & muitos erros, quaquer burocracia indevida poderá estrangular no nascedouro aquele espírito inovador que, afinal, é a única vantagem competitiva duma startup.
Enfim, Sandro... As empresas tradicionais certamente não estão aptas a analisar com sèriedade um currículo estranho desses. E os càndidatos ao mercado-de-trabalho também não têm coragem de assinar atestados de incompetência como esse: "abri seis empresas; fali todas as seis; aprendi com isso o que nenhum MBA ensinará." Não! Eles preferem assinar atestados de mèdiocridade, para serem aceitos em empresas mèdíocres, fazerem trabalhos mèdíocres e terem carreiras mèdíocres sob as ordens de tiranos boçais.
Continue sendo aquele ponto-fora-da-curva. E mande seu irmão à merda!
Fernando.
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