CARTAS PARA JOVENS EMPREENDEDORES 24
- Fernando Rogério Jardim
- 11 de jun. de 2016
- 2 min de leitura
São Paulo, 11 de Junho de 2016.
Prezada Cecília,
Além de professor e consultor, eu sou profeta, entende? Eu uso uma bola-de-cristal chamada bom senso. Além disso, meus guias espìrituais sempre se manifestam quando vêem uma nuvem de merda se formando no horizonte. Então eles aparecem para mim em sonho e me dizem em coro: "eu já vi esse filme!" Eu recomendo, portanto, que você leia os anexos dessa mensagem: há neles há detalhes técnicos que eu não quero revelar ao público. Usarei os próximos parágrafos para lhe dizer o que vai acontecer com sua empresa caso você não siga meus conselhos mèdiúnicos.
Primeiro mês. Você contratará um programador Android que lhe cobrará um salário de marajá. Você vai aceitar essa afronta, pois todos os seus preços mentais foram automàticamente inflacionados pela promessa de investimento que você recebeu (verbalmente) da aceleradora. A imagem dessa grana piscando no horizonte fará com que você não ache nada caro e, sem ter nada de concreto para oferecer ao mercado, você começará a se comprometer financeiramente, encenando papéis canastrões no teatrinho do sucesso.
Segundo mês. Você finalmente descobrirá que seu maravilhoso programador Android passava metade do tempo de trabalho fumando maconha, e a outra metade batendo punheta. Você, claro, vai demitir o desgraçado e contratar outro vigarista. Agora você terá um rombo de quinze mil reais no caixa da firma, um monte de linhas-de-código sem sentido e... um novo programador Android maconheiro que justificará sua linda existência no universo enchendo seu aplicativo com funcionalidades cosméticas totalmente inúteis. O mundo gira, a lusitana se barbeia.

Terceiro mês. Como você nunca ouviu falar em design thinking e a única coisa que você leu sobre estratégia são as baboseiras de Sun Tzu, seu plano "infalível" é desenvolver uma geringonça virtual com quatrocentos sextintilhões de linhas-de-código, lançá-la no mercado sem consultar a opinião dos clientes (¿quem são eles mesmo?) e então ver o que vai rolar. Numa palavra: seu plano se resume em contar com a sorte. ¿Há algum perigo d' isso dar certo? Mas você acho que ainda tem dois trunfos: seu programador e o investimento prometido pela aceleradora.
Quarto mês. Você finalmente descobriu que o diretor da aceleradora à qual sua startup estava assòciada é um picareta de marca-maior; e que aquele investimento prometido e tão esperado é apenas um velho conto-do-vigário para atrair jovens talentosos e ingênuos. A-propósito: aquele seu programador acabou de se demitir, pois passou num concurso-público para a Receita Federal. Aleluia! Ele vai realizar o sonho de todo brasileiro: vagabundar e enriquecer; ter uma digestão tranqüila, uma vida inútil e uma morte quieta. É um estorvo a-menos para você, afinal.
Quinto mês. Você finalmente lançou seu aplicativo. ¿Motivos para comemorar? Hum... Talvez não. Como você nunca consultou a opinião dos seus clientes, ora vejam... eles resolveram detestar seu aplicativo: acharam-no muto complicado, antipático, labiríntico, cheio (vejam só que coisa) de funcionalidades desnecessárias. Para piorar, uma versão muito mais enxuta do mesmo aplicativo acabou se der lançada na AppStore... e é campeã de downloads! — ¿Quer saber quem foi seu desenvolvedor? — Aquele primeiro programador maconheiro que você demitiu. Fim.
Eu confesso que me diverti escrevendo-lhe esta resposta para você.
Fernando.
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