CARTAS PARA JOVENS EMPREENDEDORES 27
- Fernando Rogério Jardim
- 2 de jul. de 2016
- 2 min de leitura
São Paulo, 2 de julho de 2016.
Prezada Talita,
¿Você já presenciou a triste condição duma pessoa acometida pela síndrome da roupa-nova? Por roupa nova, refiro-me ao conto, e não à banda. Se você não está lembrada da estòrinha, é o seguinte: ela narra o caso dum imperador vaidoso, enganado por alfaiates picaretas, que lhe vendem uma roupa nova feita dum tecido supostamente miraculoso, que só as pessoas inteligentes conseguiam enxergar. Agora troquemos a roupa nova por um negócio.
Pois bem. O imperador era cercado por cortesões hipócritas que garantiam que conseguiam ver a roupa mágica que ele vestia. O próprio imperador, enganado, autoenganava-se. No final do conto, ele decide então desfilar pelas ruas do reino com sua suposta roupa mágica. Todos se entreolhavam e mal conseguiam acrèditar no que viam — até que uma criança na multidão desabafou a verdade que todos estavam omitindo: o imperador estava nu!
A síndrome da roupa-nova acomete empreendedores inexperientes (como você) e apaixonados pelas próprias elucubrações abracadábricas. Eles, cegos de amor, não conseguem enxergar as deficiências escancaradas, escàndalosas dos seus próprios inventos; não vêem as brechas óbvias dos seus modelos-de-negócio; fazem ouvidos-de-mercador, ora veja, para as demandas do mercado! Essa síndrome é perigosa, Talita! E ela pegou você.

Digo isto porque nossa última reunião trouxe-me péssimas impressões sobre você. Estou sendo sincero. Depois de alguns minutos, eu pensei comigo: "poxa, essa moça é teimosa; está fanàtizada por sua invenção; é uma aiatolá islâmica prèvenida contra argumentos." Lembre-se: a cada detalhezinho problemático que eu apontava em seu aplicativo, você reagia não como uma empresária, mas como uma advogada. E isso não foi um elogio, Talita.
Claro: o brasileiro é um povo invejoso e filho-da-puta que toma o sucesso alheio como ofensa pessoal. Muitas pessoas, portanto, tentarão colocar você para baixo, desancando sua iniciativa de empreender. Mas outras pessoas só falarão coisas legais sobre suas idéias para fazerem você se sentir bem. E isso é pior ainda, porque o recurso mais valioso para o empreendedor inexperiente é a informação — e isso só chega por meio das críticas!
Então, Talita, entenda o seguinte: eu não sou seu amigo nem parente. Eu não quero ficar "bem na fita" com você. Você me contratou como consultor. Por isso, não espere que eu desempenhe o papel do cortesão puxa-saco que mantinha o imperador preso em suas mentiras vaidosas. Não. Eu sou a criança plebéia que gritará da multidão, alto e em bom som: "seu aplicativo é uma bosta! seu aplicativo é uma bosta! seu aplicativo é uma bosta!"
É a verdade.
Fernando.
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