CARTAS PARA JOVENS EMPREENDEDORES 32
- Fernando Rogério Jardim
- 6 de ago. de 2016
- 3 min de leitura
São Paulo, 06 de Agosto de 2016.
Prezado Anselmo,
E lá vamos nós outra vez. Eu sabia que minha resposta da semana passada ensejaria uma tréplica estupefata e revoltada da sua parte. Lendo sua mensagem, imaginei você com as patinhas dianteiras levantadas, relinchando assustado "a crise é feia! a crise é boba! a crise mata!" Não, presado Anselmo. Discordo novamente. A zona-de-conforto é uma coisa mil vezes mais perigosa que uma crise, por pior que esta seja. A crise é a água gelada na bunda que o salva do imòbilismo entorpecente. Já a zona-de-conforto é a areia-movediça a soterrá-lo devagarinho, num doce e morno abraço para a morte.
Vamos por partes. Primeiramente, fico feliz por você ter entendido minha explicação sobre a formação e natureza das crises. Agora você pode se considerar mais informado e inteligente que toda a gangue de economistas alimentados com alfafa pelo PT. Lembre-se: eu disse que as crises são os momentos em que aqueles negócios, projetos ou empregos que jamais deveriam ter sido criados são desfeitos. É o momento em que a carruagem vira abóbora, o sapatinho de cristal vira sapatêns de borracha ordinária. Eu encerrei a mensagem dizendo que não há nada para se lamentar numa crise.
Foi aí que você ficou puto, né, Anselmo? ¿Você ficou com dòzinha dos empresários fanfarrões, que abriram negócios faraônicos com o nosso dinheiro, via bancos públicos? ¿Você ficou com peninha dos herdeiros do petismo, que se endìvidaram gostosamente até a vigésima geração, na base do crédito fácil e do bolsa-miséria? Há coisas, Anselmo, cujo fim precisaria ser comemorado à vista e com desconto. Só lamento que nós sairemos dessa crise apenas para entrar em outra igual. Crises são belas como julgamentos merecidos: é o juízo final que pune os idiotas e oportuniza os prèvidentes.

Existem coisas, ó indignado & compassivo Anselmo, que nós só conseguimos fazer em tempos de crise. Nas crises, os aluguéis despencam. Aquele bairro bacana, aquela sala comèrcial, aquele galpão espaçoso — que não eram para seu bico meses atrás — baixaram a linha-de-corte e se tornaram acessíveis. Empresas falidas ou em processo falimentar estão lìqüidando equipamentos, ferramentas e máquinas a preço de ferro-velho. Estas são janelas-de-oportunidade que, se desperdiçadas, só retornarão com a próxima crise profunda, quer dizer, daqui a dois ou três anos.
A necessidade gera inventividade. Espero que a crise faça com que você repense sua planilha de custos. Você descobrirá que gastava com coisas escàndalosas, mirabolantes, desconhecidas. Você deve acompanhar minhas pùblicações no blog Start-Aspas, e certamente já me ouviu falar dos modelos enxutos. Pois bem, Anselmo: a crise é o momento de desidratar, de esturricar sua empresa! Use-a como uma oportunidade de inovação produtiva, pois embora os fornecedores, com a crise, fiquem mais dóceis, os consumidores ficam mais agressivos, exigentes, avarentos.
No mais, as crises agitam as coisas, despojam os gigantes e abrem buracos em muros largos para você passar. A perturbação generalizada criada pela crise fàcilita os ataques-relâmpago, as guerrilhas-surpresa. Se você tiver um mínimo de prèparo, audácia e senso de timing, terá excelentes ganhos. E saiba que não há nada melhor que uma startup — enxuta, pequena, esperta — para se infiltrar nas pequenas brechas abertas pela crise. Então, faça algo. Eu não sei o quê, mas faça. Pare de usar a crise, antes, para desculpar seu imòbilismo; e não use a crise, depois, para justificar seu insucesso.
Aja!
Fernando.
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